domingo, 12 de abril de 2009

Limbo


Aquela sensação de estarmos no transito e ouvirmos uma sirene de ambulância que nos impele a mexer o nosso carro nem que seja nos pequenos milímetros que nos distanciam dos carros que nos rodeiam…

Essa…

Em que por momentos todos nos desviamos um bocadinho, nos esquecemos da violência e falta de paciência no trânsito, em que o coração aperta e acelera na esperança de termos ajudado nem que seja num milionésimo de segundo alguém que necessita.

Essa sempre mexeu comigo…

Demasiado humana, intensa, sei lá… Quero acreditar que todos somos assim.

Sei que tudo está bem…
Sei que tudo está como deve estar e que o meu pai está bem.
No entanto existem momentos que fazem o meu coração acelerar e recordar momentos tristes.

HOJE EXPIO-OS!
(com a sua licença)
Pode ser que ao escrevê-los para a próxima seja diferente...

Caio em mim se estiver na Avenida da Liberdade e vir uma ambulância a passar. Lembra-me doces almoços interrompidos por uma sirene quinze dias depois da partida do meu pai. Onde parava de falar e me abstraía pensando que o meu pai tinha percorrido aquele caminho tantas vezes de ambulância em direcção ao Hospital de São José.
Caio sempre que percorro a Radial à sexta-feira à noite em direcção à casa dos meus pais. Lembro-me das viagens alucinantes em direcção à casa dos meus pais, sempre que a minha mãe me ligava, quase sempre por volta das onze da noite, a dizer que tinha chamado o INEM.

Páro e fico apertada quando chego à rua dos meus pais de noite e vejo uma ambulância parada.

Quando estas duas últimas coincidem (que já aconteceu) o resto da noite é tremendamente para dentro. Sem dor, mas estranho e intenso.

Apercebo-me hoje que falo da morte como partida, sem qualquer pudor ou receio. Falo não com alegria por respeito a quem não me percebe, mas como uma bênção, uma nova porta, uma janela, uma nova jornada. Sem mágoa ou raiva apenas doçura e saudade. Até a considero bonita quando a vida que partiu, sabe e tem noção que viveu. E sabe… Acredito que todos fazemos as nossas pazes no momento em que partimos… mesmo que a vida não seja longa, mesmo que a partida seja súbita. Como acredito, não sei… Mas acredito, ponto.

Apercebo-me hoje que até a dor, as doenças prolongadas, como a do meu pai, são um processo de paz, de luta interior. Mas neste caso, mesmo acreditando no que escrevo, acaba por me ferir um pouco.

Aceito melhor a partida que a doença. Aceito melhor o fim (e se quiserem acreditar - o recomeço) que o limbo.

Os carros funerários já não me fazem confusão.

As ambulâncias põem-me… “diferente”…



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