domingo, 21 de fevereiro de 2010

Cartas de Amor

Antes, ainda no tempo dos nossos tetraavós, só as havia para quem sabia escrever. Muitas palavras ficavam por escrever, por também haver quem não as soubesse ler. Da sorte da existência de dois serem literados, nasceram as mais apaixonadas e vibrantes cartas de amor. Trocadas como bilhetinhos, passadas por aias ou pessoal de confiança, lacradas de amor, impregnadas de sonhos.
O amor existia em todo o lado, mas as cartas de amor, existiam apenas entre os seres mais afortunados.

Passou-se algum tempo, bastante aliás, e a escrita começou a ser o meio de contacto não só das classes mais altas, mas também daqueles cujos entes mais queridos partiam para outra cidade, outro país, por guerra ou à conquista de uma nova e quem sabe promissora vida.
O amor continuava a existir, mas as cartas também elas com amor, transmitiam sobretudo notícias. Para acalmar as saudades, para desanuviar das desilusões, para manter acesas as ligações, de amor e família. Muitas vezes, o recebimento de uma carta era um sinal de que o remetente estava vivo. E demoravam dias, meses a chegar, por barco, cavalo e mais tarde até por comboio. E quando chegavam era um alívio.

Eu ainda sou do tempo em que não existia o correio azul, muito menos o verde e já nem sei se agora há mais cores. Eu sou do tempo em que com quinze anos escrevia cartas a pen pals e sobretudo ao meu namorado. Escrevia numa semana, metia-a no marco do correio redondo e vermelho logo a seguir e passados uns quatro dias recebia uma resposta. O meu coração batia ao abrir a caixa do correio ansiosa pela carta que, quem sabe, naquele dia iria receber. E quando a recebia o elevador era demasiado lento, ainda mais lento que ao costume, para me poder enfiar no quarto sozinha a ler. Guardei-as todas. Aliás, tenho todas as cartas em papel que recebi até me mudar de casa, guardadas religiosamente num baú em casa dos meus pais.
Não as leio há muito tempo, mas tenho a certeza que são puras e doces. Mas não são de certeza apaixonantes como as cartas trocadas entre amores em tempos idos. As minhas são adolescentes, inexperientes de vida. São arco-iris, não são fogo que consome, não são mar que acalma, não são quentes de amor, são pura e simplesmente pink.

Nunca mais escrevi cartas, cartas. Aliás, já são raros os marcos de correio. Visitas aos Correios só para levantar encomendas, cartas registadas ou enviar os já raros postais de Natal. Saudades.

Agora com as novas tecnologia, com a internet, com todas as vantagens que ela traz, estamos todos mais perto. Sabemos todos de todos, basta querermos. Mas ao mesmo tempo estamos tão mais longe…
Até as palavras são comidas, como se o amor, a escrita precisassem de abreviaturas… Como se o amor pudesse ser resumido em “<3”. Gosto mt de ti… Pq é q o mt fica sumido? É -?

Não gosto. Ponto.
Gosto de encher a boca para dizer o que sinto e muitas das vezes parece que o que digo é tão menor do que o que sinto. É imensurável…

Fazem falta cartas de amor entre as gentes. Cartas de amor com destinatário e remetente.

Remetente - Uma carta é um ciclo, um círculo continuo, quem ama envia a quem ama, se o destinatário não responde, não remete, ou não está vivo, ou não ama como o remetente, quebra-se o ciclo.

2 comentários:

  1. afinidades...sensibilidade de almas que possuem a mesma origem, caminhos semelhantes.
    mais uma vez leio aquilo que gostaria de ter escrito.

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  2. O tempo já não é o mesmo, andamos sempre a "correr"... e há demasiadas coisas a acontecerem depressa demais.

    A pressa com que se escreve 1 e-mail, com que se faz 1 telefonema, se lê 1 post. A pressa com que se vive a rotina ou se abomina essa monotonia, tudo sempre com muita pressa. Até no amor.

    Num tempo assim é natural que as cartas de amor estejam em vias de extinção.

    Adoro o meu tempo, este em que vivo, mas muitas vezes penso, como seria bom viver nesses outros tempos em que tudo se absorvia mais lentamente.

    beijo enorme.

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