sábado, 2 de janeiro de 2010

A carta

Na noite de 26 de Dezembro no bar mais cool em Évora, um bar marroquino grande mas aconchegante, com várias salinhas, em conversa com o meu primo lembrámo-nos de uma carta que o nosso avô deixou escondida no seu cofre para que os seus filhos a pudessem ler após a sua morte. Soubemos da sua existência num almoço de família em Évora em finais de Março de 2006, quando por altura da celebração do centenário dos meus avós (se estes fossem vivos), uma nossa tia se levantou e a começou a ler. Uma outra prima que estava connosco no mesmo bar não se lembrava nem do momento, nem da existência da carta. Lembro-me que quando a ouvi pela primeira vez, me tocou bem fundo. Mas aquelas quase dez páginas manuscritas em algo, naquele momento, me fizeram sentir mal comigo, por conta do momento e fase em que na altura me encontrava.

Voltámos para Lisboa depois das festas natalícias, lembrei-me uma ou outra vez da existência da tal carta, mas sempre que estava com a minha mãe esquecia-me na totalidade de lhe comentar a conversa com os meus primos no dia a seguir ao Natal e de lhe perguntar se teria uma cópia da carta para a reler.

No dia 31 de Dezembro fomos almoçar com a minha mãe no restaurante onde quando o meu pai estava vivo e de saúde íamos almoçar quase todos os dias.

A passagem de ano foi passada calmamente em casa de amigos, em Lisboa e a da minha mãe com todos os irmãos e alguns sobrinhos em casa de uma irmã.

No primeiro dia do ano fomos almoçar com o avô paterno da minha filha, e ao telefone com a minha mãe senti-a triste.

A minha princesa foi brincar para a casa da sua vizinha e amiga Rita, e eu agarrei em mim à hora do lanche e fui a casa da minha mãe. Quando lá cheguei a casa parece que se iluminou, a sua tristeza desvaneceu-se e abraçou-me. Disse-me que lhe fazia confusão estar o primeiro dia do ano sem mim. Que se sentia sozinha, que agora só me tinha a mim e à pequenina. Respondi-lhe que não era verdade. Que ela ao contrário tinha irmãos que se adoram. Eu não tenho nenhum. Eu sim poderia utilizar as suas palavras de só a ter a ela e à minha pequenina, mas não as utilizo. Os meus amigos, aqueles, com que sei sempre contar, aqueles que preenchem cada dedinho da minha mão, são como meus irmãos e o meu pai está sempre comigo.

De repente, lembrei-me da carta e falei-lhe. Ficou intrigada por eu saber da existência da carta. Mais intrigada por ver que eu era a única. Relembrei-lhe que a carta tinha sido lida por ocasião do centenário de nascimento dos seus pais, mas parece que esse momento passou por muitos familiares como um vazio e só poucos se lembram. Comentou-me ainda que nunca eles, os filhos dos meus avós, revelariam a existência da carta. Fiquei intrigada. Perguntei-lhe se a carta tinha alguma revelação especial ao que ela me respondeu que não, que a sua estranheza era porque a carta tinha apenas sido escrita para os filhos e que por isso não faria sentido revelá-la. Explique-lhe que os netos são os filhos dos filhos e que fazia todo o sentido partilhar a experiência e palavras do avô. Que decerto seria isso que ele pretenderia, que os seus princípios e vontades fossem prolongados por várias gerações. Disse-lhe ainda que aquela carta era um exemplo daquilo que eu quero levar em frente, como projecto.

Levantou-se e foi buscá-la. Disse-me para a ler em voz alta. E li…

Aquilo que me feriu em 2006 não me magoou nem um pouco, nem passou ao lado. Fez-me sorrir. Por ver que afinal de contas, tirando o facto de não ser uma católica praticante diária, sou não só por sangue, neta do meu avô. No final da carta, sem dar por isso comecei a assumir a carta como se fosse o meu pai a escrevê-la para mim e comecei a engasgar-me e as lágrimas começaram a cair-me docemente como o haviam feito na missa por sua alma a 30 de Junho no Hospital de São José.

Abracei-a quando saí de casa. Agradeceu-me por lá ter ido, por aquele momento e disse-me que me adorava. Retribuí com o mesmo amor.

O caminho para casa a conduzir, foi estranho. Já noite, com o tempo carregado, as lágrimas caíram-me de novo. Mas não de tristeza. De paz e arrebatamento.

Assim que saí do carro as lágrimas enxugaram e o sorriso tomou o seu lugar.

Terminei o final da noite já a entrar no dia dois de 2010, a ver uma comédia romântica que adorei, me fez bem, de título “Proposta” com a Sandra Bullock.

Acho que foi um bom começo de ano :)

E amanhã IUPI!!!!… A minha mais que tudo faz seis anos. Tão crescida… :)

1 comentário:

  1. Amiga,
    por esses dias de natal e ano novo estive longe da internet, a visitar amigos no interior, a descansar um pouco da lide diária.
    hoje retorno e tenho o grato prazer de ver meu nome citado em sua lista de amigos na virada do ano. isto me faz maior.
    desejo-lhe e aos seus um feliz 2010, com muito trabalho e sucesso, acompanhado de alegrias e satisfação para o corpo e para a alma.
    vejo, também que ontem foi o aniversário da miúda. parabéns, embora atrasado. felicidades!
    daqui do Brasil,

    ResponderEliminar